terça-feira, 21 de janeiro de 2014

O céu dos suicidas, Ricardo Lísias



 É muito difícil julgar O céu dos suicidas.
A literatura tem algo de sagrado quando toca o cerne da experiência humana.
Acredito que Ricardo Lísias tocou nesse sagrado.

A história é contada por “um certo” Ricardo Lísias, historiador e especialista em coleções, que passa por um momento bastante conturbado. Vive imerso na dor provocada pelo suicídio do amigo André – e é a partir dessa dor que ele olha para sua vida, seu trabalho, sua família e para o mundo, e claro que tudo fica fora de foco.

Não é exatamente isso, embora possa ser sim: “Ricardo” está em uma odisseia. Ele busca saber para onde foi o amigo. E é aqui que ele toca algo que não tem nome. Nós não sabemos e nunca saberemos para onde vão os suicidas.

Durante sua busca por respostas – que na verdade é uma busca por consolo – ele encontra brutalidade, violência e intolerância nas respostas. Todas as religiões condenam os suicidas, são pecadores, atentaram contra ao direito sagrado da vida, são covardes e vão diretamente para o inferno – ou a variação do inferno, dependendo do humor de cada religião. E quando ele diz: “Os suicidas sofrem, Deus desgraçado”, não há como seu coração não tocar, por um segundo, nessa dor.

O que “Ricardo” quer é que seu amigo vá para o céu. Daqui, de onde ele está, vivo e impotente, sua busca é para que as pessoas concedam o céu a André.

Nesse ponto é uma narrativa forte, intensa e verdadeira.

Mas a narrativa destoa em outros momentos. Acho que o autor regeu a orquestra sem dar atenção suficiente aos instrumentos de fundo e, aos meus ouvidos, algumas notas soaram desafinadas e soltas. A família, as pessoas que ele encontra e os movimentos de “Ricardo”, destoam muito da força narrativa de outras partes do livro. As mudanças bruscas de humor de “Ricardo” soaram fáceis e forçadas e não me convenceram. E nos momentos de humor, eu não ri.

Então, eu não gostei disso e não gostei daquilo, mas não posso dizer que o texto não tem força, que não mexeu comigo, e que não toca de forma contundente em um ponto nevrálgico da condição humana. 


13 comentários:

  1. Esse livro está na minha meta desde 2013, mas o emocional não me permitiu, vamos ver agora em 2014...
    Xerinhos, lindeza!!

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    1. É duro mesmo, Paty. Espero que você goste.
      Depois me conta,
      beijo grande!

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  2. Apesar de concordar que às vezes a mudança de humor parecia exagerada demais, diria até artificial, eu gostei muito do livro no geral.
    Achei a narrativa muito boa, um ritmo constante e essa indagação sobre o céu/inferno muito válida, afinal de contas quem não se questionou nesse sentido?
    Um beijo!

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    1. Renata, o ponto alto para mim foi essa questão céu/inferno. É muito forte e ele constrói o texto com maestria nesse sentido.

      Outro beijo!

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  3. Eu gostei muito desse livro Maira, mais do que Divórcio. Esse tema mexe muito comigo e a forma como ele narrou foi muito visceral, tinham alguns trechos que eu sentia o soco no estômago junto com ele. Eu entendo o que você falou, mas acho que justamente por isso ficou tão forte, dava pra sentir a explosão de raiva dele!
    Adorei o texto Maira:D
    Beijo!

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    1. Entendo seu ponto, Tati. Mas, não se engane, eu gostei muito do livro, viu?

      Beijão!

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  4. Nem preciso comentar que estou curiosa para ler “O Céu dos Suicidas”. Tenho “O Livro dos Mandarins”, mas quero começar Ricardo Lísias por “Suicidas”. Enfim, imagino a dureza que deve ser a narrativa =/. Beijos, Maira!

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    1. É dureza, Lulu. Lê e depois me conta, quero saber o que você vai sentir/achar!

      beijo grande,

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  5. A temática é mesmo muito forte e a polêmica em torno do assunto não é de agora. Preciso me preparar para ler esse livro. Ótima resenha! Parabéns!

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    1. Esse é o tipo de tema universal, Raquel. Prepare-se então, rs.
      bjs!

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  6. Oi Maira!
    A sensação que eu tive lendo o livro foi mais ou menos essa que você teve: ele pegou um tema delicadíssimo e muito difícil, mas o livro em si não me empolgou, achei que ficou confessional demais e em termos literários não foi muito além disso. Talvez eu não tenha nada tão ligado ao tema para ter sentido mais forte a questão.
    Mas não é um livro necessariamente ruim e não é um livro que nos deixa indiferentes.
    O que eu acho curioso é que essa coisa de nem sabermos pra onde vamos depois da morte, se o céu existe ou não, mas não querermos que os suicidas sejam privados dele, caso ele exista.

    Beijo ;)

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    1. Pois é, Camila. Não sei, para mim essa parte do suicídio é bem forte e ele consegue atingir o que se propõem, meu problema foi com os outros elementos da narrativa.
      Mas é um livro inesquecível.

      Beijo grande,

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  7. Não li O Céu dos Suicidas, mas li Divórcio, onde ele tenta simular a loucura que viveu em virtude do trauma. O livro tem boas sacadas, mas não achei sensacional. Li muitos elogios a respeito da obra dele e fui com muita sede ao pote. Só que acabei achando apenas OK. Como você comentou na resenha, alguns momentos soam muito fáceis, certos recursos um tanto capengas. Mesmo a questão do jogo com o real, a autoficção, ele não conseguiu manejar de forma muito original. Acho que não lerei o escritor novamente tão cedo, rsrs. Abraço!

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