quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

On the road, Jack Kerouac



Em abril de 1951, entorpecido por benzedrina e café, inspirado pelo jazz e em uma América dura e recém-saída do pós II guerra, Jack Kerouac escreveu em três semanas o que viria a ser On the road, o livro que teve tanta importância e influenciou tantos artistas a abraçarem seus chamados e encontrarem suas vozes que se tornou  uma obra mito da literatura ocidental.

Parece que estou exagerando?
Certo, Bob Dylan fugiu de casa após ler o livro; Babenco também; Jim Morrison fundou The Doors; a obra do Bukowski tem muito da influência do livro, assim como as de Wim Wenders (e olha que eu já poderia parar por aqui), Lou Reed, Tom Wolfe e Gus Van Sant, só para citar alguns.

Mas o mito que envolve o livro acaba não sendo apenas o histórico. Existem muitas coisas que não foram ditas, e outras ditas em demasia, e grande parte delas tem o próprio Kerouac como responsável. Talvez o maior mito seja sobre ter passado sete anos na estrada e ter escrito o livro em três semanas.

A questão é que On the road  foi mesmo escrito em três semanas, três loucas semanas em que Jack datilografava 12 mil palavras 14 horas por dia no famoso rolo de papel para telex com 40 metros de comprimento, em espaço 1 e sem parágrafo. Só que o livro passou anos para ser publicado, e quando digo anos, quero dizer seis longos e desesperados anos (Kerouac, em uma carta no final de 1956, ameaçava abandonar “essa história de romances épicos e tentar concentrar meu talento – se é que tenho algum – no que quer que não seja escrever”) E enquanto o livro ia sendo rejeitado por todas as editoras que recebiam o material, Kerouac foi reescrevendo o texto, e ele fez isso várias vezes. E quando o livro foi finalmente aceito Kerouac foi forçado a suprimir 120 páginas. Depois, seu editor cortou mais algumas e também acrescentou “as milhares de vírgulas inúteis” que o indignaram profundamente. Eduardo Bueno, o tradutor da versão brasileira, chega a dizer que a famosa “prosa espontânea” praticamente inexiste em On the road. (Hoje faz muito mais sentido aquela edição de capa branca que a própria L&PM lançou em 2011, com o texto original, retirado do próprio rolo de telex e com os verdadeiros nomes dos personagens – é claro que você sabe disso, mas vou dizer de novo porque não canso, Carlo Marx é...Allen Ginsberg, meu poeta preferido, acho).

O livro, dividido em cinco capítulos, fala das quatro viagens que Sal Paradise fez ao lado do eternizado Dean Moriarty a partir da, tão eterna quando o próprio livro, Rota 66. Muitas vezes de carona, mas quase sempre em um carro velho e descompensado, lá iam eles encontrando todos os tipos de pessoas, ouvindo histórias, parando em inúmeros bares, encontrando mulheres e entorpecentes, e tudo isso geralmente num mesmo parágrafo.

E o bom é que para além de toda edição, o ritmo frenético daquela escrita me saltou aos ouvidos. E isso é realmente bom, porque era o que Kerouac queria. On the road é para ser lido em voz alta e em inglês, para que suas frases cheias de vogais rimem loucamente como um poema desvairado. Muito dessa energia se perdeu nas revisões e um pouco mais na tradução, mas não toda, e é possível sentir no texto a ansiedade de Sal e sua busca pelo “algo” que marcou sua geração.

Um “algo” que ele descreve bem quando encontra uma garota num ônibus a caminho de Detroit. “O que estamos todos loucos para fazer? O que queremos? Ela não sabia. Bocejou. Estava com sono. Era demais. Ela jamais compreenderia. Ninguém poderia lhe explicar. Estava tudo acabado. Tinha dezoito anos, era quase encantadora, e estava perdida”.

Porém, fico me perguntando se, já perto do final do livro, Sal começa a se cansar de Dean. Porque, sinceramente, eu me cansei. E toda essa ideia de busca, de vida e do chamado da estrada começou a soar como balela de um babaca que engravida mulheres e as abandona quando fica de saco cheio delas e de si mesmo.

Só que isso é uma droga! Porque On the road é um clássico e fez Bob Dylan decidir ser o que é, então pode ser, PODE SER, que tudo não passe de rabugice de alguém que está chegando aos 30 e perdeu um pouco a paciência. 

* Praticamente todas as informações citadas nesse texto serão encontradas por você na introdução escrita por Eduardo Bueno para a edição da L&PM. O que não estiver lá deve ter sido fruto da minha imaginação ou inteligência (difícil saber). 

14 comentários:

  1. Maira,
    Acho que "On the road" é aquele tipo de livro que só tem o efeito arrebatador se lido em determinada idade. Eu tive a mesma sensação que você. Em determinado momento da leitura, já estava querendo dar uns chacoalhões no Dean e dizer "E então, meu filho? Não está na hora de crescer e assumir responsabilidades?". Também me sinto rabugenta e sem paciência para aventuras juvenis.
    beijo!

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    1. Adorei, Michelle, rs. o/
      Concordo muito com você, mas também acho que nosso anseio juvenil mudou, não sei bem.

      beijo grande,

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  2. Oi, Maira.
    Tenho muita vontade de ler "On the road" por ser um livro que influenciou TANTA gente,e ser o preferido de uns amigos e porque uns amam, outros odeiam e assim, eu fico curiosa ;D
    E eu não sabia em que fora inspirado Carlo Marx, obrigada!!!

    Beijos!

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    1. Ahaha! Jura? Maura, lê alguma coisa do Ginsberg, tenta "América" ou "Canção". Sério foi uma das coisas mais fortes e inesquecíveis para mim.

      beijão!

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  3. Maira, eu li esse livro pela primeira vez aos 18 anos, mais ou menos. E eu fiquei enlouquecida, foi arrebatador. No entanto li novamente aos 36 (tem texto lá no blog) e foi um pouco triste porque fiquei irritada com muitas coisas e o livro perdeu um pouco do brilho que eu guardava dele. =(

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    1. Ai, Lua, sério? Vou lá ler seu post. Imagino como deve ser ler esse livro com 18 anos. Arrebatador, com certeza!

      beijo grande,

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  4. Oi, Maíra. Conheci seu blog através de um marcador de página que me foi entregue no balcão da Fox Vídeo. Gostei muito do que encontrei. Aguardo as próximas postagens. Clarissa.

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    1. Oi, Clarissa, fico muito feliz por você ter vindo aqui, e mais por ter gostado.
      Obrigada,

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  5. Taí um livro que estou querendo ler há uns anos já. Assisti ao filme e curti a atmosfera; imagino que o livro deva ser tudo aquilo intensamente multiplicado. Procurarei ler num futuro não muito distante (tenho tanta coisa para ler no futuro "imediato" haha), acho que vou comprar uma dessas edições de bolso que vejo na banca.

    Beijo, Livro Lab

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    1. Aline, acredita que não vi o filme? Mas sei que foi bem elogiado.
      Nossa, entendo você, eu também tenho livros e mais livros para ler no "futuro imediato", "não tão imediato", e "bem distante". Ahaha!

      bjs!

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  6. Pra ser sincera nunca tive vontade de ler On the road. Eu tenho o livro (a mesma edição que a sua) para o dia que essa vontade aparecer. Bem, sua resenha bem humorada plantou uma semente nesta falta de vontade ^_~
    Uma dúvida: a edição de capa preta da L&PM é a versão com o texto original ou o editado?
    Beijos, Maira!

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    1. Lulu, essa edição de luxo (vulgo, capa preta, Ahaha!) é a editada e a que circulou mundo a fora. Me referia, da forma mais imprecisa possível, aquela de capa branca, que se não me engano, está escrito "manuscrito original", acho o.O

      bjs!

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  7. Eu costumava dizer que "On the Road" era o livro da minha vida. Eu li aos 19 anos, quando estava cansada da vida rotineira e querendo algo novo. Eu fiz uma tatuagem baseada nele, quase toda semana tinha post a respeito no meu antigo blog e eu o indiquei para todo mundo. Mas lendo as resenhas dos meus amigos, ouvindo os comentários, me dá certo medo, sabe? Tenho medo de que a nova leitura (que deve ser a terceira ou quarta) não me traga as mesmas sensações.
    A gente envelhece e nem percebe, né?
    Beijos

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    1. Ai, Michelle, acho que você não deve reler, então. Guarde toda essa emoção e significado no coração. Você, provavelmente, foi mais sortuda que nós outros, velhos de trinta anos que ainda não tinham lido o livro. Sério.

      beijo grande,

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