sábado, 28 de dezembro de 2013

O jogo da amarelinha, Julio Cortázar



Eu já tinha planos para ler O jogo da amarelinha em 2014, mas era um plano fluído, sem uma data certa. Mas então, conversando com a Lulu, do blog Lulunettes, descobri que ela estava lendo o livro e de alguma forma achei que aquele era o momento, que minha hora de jogar a “amarelinha” de Cortázar havia chegado. 

E havia chegado mesmo. E foi na hora certa. E foi incrível.

Do Cortázar eu já tinha lido “Prosa do Observatório”, que foi um livro que produziu um eco cujo som nunca deixou de soar na minha alma, basta que eu procure e sim, ele está aqui.

Mas eu não sabia o que esperar de O jogo da amarelinha além das famosas “duas possibilidades de leitura”, sendo a primeira a do romance clássico, que começa pelo início e quando chega ao fim, para; e a segunda a do “jogo” cortazariano, a “amarelinha” que ele convida o leitor a jogar, seguindo a pedra que ele deixa ao final de cada capítulo e que nos faz “pular” literalmente no livro. E isso era tudo o que eu sabia, além de sua importância para a História da Literatura Ocidental.

E assim que fui terminando os primeiros capítulos alguns comentários que sempre ouvi começaram a fazer sentido: “a bíblia de uma geração”, “pessoas decoravam trechos da obra e a citavam como um reflexo do que eram”, “o livro que encantou a juventude” e “um dos responsáveis pelo “bum” da literatura latino-americana na Europa”. E tudo isso fez muito sentido. Mas eu não estou aqui para dizer “leia O jogo da amarelinha”. Não, de uma forma muito cortazariana, acho que o livro chegará até você no momento certo.  E eu estou aqui apenas para relatar a experiência de leitura que tive, a incrível, irrevogável e irreversível experiência de leitura que tive.

Bom, talvez o que eu vá dizer a seguir não tenha muito valor, pois a escrita de Cortázar é muito característica, assim como sua forma de abordar o homem, a vida e o que está no meio disso. Mas, se alguém me pedir um conselho – e nunca ninguém pede, mas eu sempre dou – esse seria o seguinte: não procure saber sobre o enredo de “amarelinha”, aceite o desafio de Cortázar e jogue o jogo. Comece do capitulo 73 e siga a trilha, e que a cada texto, você comece a ouvir e encontrar vozes antigas, vozes que você já ouviu, mas que possivelmente esqueceu ou quis esquecer – são as vozes da sua alma, da sua humanidade (cof, cof, cof – isso ficou profético, mas desculpe, é o que temos para hoje). Mas sei que algo precisa ser dito, então que seja apenas que O jogo da amarelinha conta a história de um argentino, que se exilou em Paris, e tem uma busca, está procurando o algo; e que, como toda criança que pula amarelinha, está tentando chegar ao céu. Mas o livro é a leitura – não consigo pensar nele de outra forma, é aceitar o convite ao jogo e “pular” a rayuela que Cortázar desenha.

E não há como voltar do mundo de Cortázar, é bom que você saiba desde já.

E foi estranho. E foi quando eu percebi o que disse acima. O livro é a leitura. Não é a toa que o chamam de “labirinto”, foi assim que me senti no meio daqueles capítulos, pulando do 62 para o 23 e depois para o 124, por exemplo. É uma quebra de paradigma começar um livro no capitulo 73, o peso do livro na mão é diferente, e a sensação de estar perdida dentro do livro foi algo muito presente. Eu ia seguindo, indo do início ao final várias vezes, e essa sensação de não saber onde eu estava na leitura foi crescendo (no início? na metade? mais da metade?). Existe um mapa, no início do livro para guiar o leitor por dentro do labirinto e, em certo momento, eu estava tão agarrada a esse fio, querendo tanto me localizar e saber onde eu estava que percebi que é sobre isso e é esse o convite que Cortázar está fazendo: perca-se, caminhe casa a casa, deseje e aguarde que a cada passo você esteja mais perto do céu, e do fim e das respostas.

Para mim isso é a vida, e se não for, meus amigos, eu devo estar fazendo essa coisa errada.

“Um jogo da amarelinha na calçada: giz vermelho, giz verde. Céu. A calçada, lá em Buzarco, a pedrinha tão amarronzadamente escolhida, o breve empurrão com aponta do sapato, devagar, embora o céu esteja perto, toda a vida pela frente”.

Sei que esse texto precisaria de um ultimo parágrafo. De algo que sintetizasse minha leitura e unisse tudo que escrevi anteriormente, como uma linda conclusão. Mas não, ele acaba aqui... “de uma vez por todas e em paz e já chega”.

PS: Lulu, obrigada pela companhia!


12 comentários:

  1. Maira de deus ! Que texto incrível ! Já vi muitas recomendações sobre esse livro, mas a sua foi a melhor !
    A cada frase o livro parece incrível e mais incrivel!!!
    Cortázar me espere m 2014!
    Parabéns pelo texto!!
    bjos

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  2. Adorei seu texto, Maira! :)

    Vou ler O Jogo da Amarelinha agora em Janeiro, chegou a hora dele para mim :)

    beijo,

    Pipa

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  3. Antes de agradecer pela companhia: Maira, que resenha linda, incrível e poética *___* Amei!!! Você destacou os pontos que realmente importa. (...) Aguarde um pouco, vou me recompor do meu surto carinhoso (rsrsrs). Pronto! Então, quero agradecer pela adorável companhia e pelas conversas esclarecedoras e divertidas. Muito obrigada! (só reforçando: sua resenha está impecável! <3)
    Beijos, querida!

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    1. P.S.: não estou conseguindo enxergar a página na foto, mas é a do último capítulo do 'jogo', né?!

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  4. Meu Deus, Maira, que texto INCRÍVEL! Quantas vezes eu já estive com O Jogo da Amarelinha em mãos para iniciar a leitura, mas algo me parava... Esse seu texto me deu a coragem que talvez ainda estivesse faltando!

    Bjs, Lari!

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  5. Que lindo, Maira!
    A gente ouve tanta coisa sobre a maravilha que é esse livro que acaba ficando intimidado. Mas se tem uma pessoa que conseguiu me deixar um pouco menos apreensiva sobre a leitura, foi você. Sério. Lembrarei do seu texto quando chegar minha hora de jogar amarelinha.
    beijo.

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  6. Maira, você e a Lulu deixaram todo mundo com vontade de ler esse livro, ai, ai, ai, quando eu conseguir ler quero conversar com vocês depois! Lindo texto! Beijão e feliz ano novo!!!

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  7. Nossa, Mairaaaaa!!
    Concordo com a Lua, essa tua resenha convenceu mesmo!!
    Inclusive estou comprando ele neste momento, até porque eu não li nada desse autor ainda! :D
    Um beijo, Cami!

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  8. Nossa, sua resenha simplesmente despertou uma vontade de ter esse livro IMEDIATAMENTE!!!
    Com certeza você usa as palavras a seu favor! Adorei!!! :)

    Estou começando um blog, fala sobre um pouco de tudo, e também vou falar sobre livros... Dá uma olhada se puder
    sugarylemonade.blogspot.com.br

    Beijos

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  9. Fiquei muito curiosa para ler! rsrs!
    Você escreve muito bem Maíra!!!

    Adorando conhecer teu espaço!

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  10. Confesso que alguns livros me metem medo, alguns autores também e O Jogo de Amarelinha é um deles. Mas olha, depois do que li em teu texto, estou pensando seriamente em me atrever, quem sabe? Quando fizer isso, te conto... juro. Mas torça para que eu consiga entender! Beijos

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  11. Ótima resenha! Meu Rayuela tá lá em casa me esperando tomar vergonha na cara. Resolvi ler em espanhol depois de ter conseguido ler o História de Cronópios na língua original, mas isso meio que aumentou a minha preguiça. rsrs Sua resenha me deixou instigada, no entanto. Gostei muito de tudo que li do Cortázar até agora. Achou que irei adiantá-lo na fila. ;)

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