Acabei de ler “O apanhador no campo de centeio” *. Estou a
horas tentando escrever alguma coisa coerente, mas não consigo. Acho que o que
Salinger fez ali é algo que não se encerra e nem cabe em críticas, resenhas ou
impressões de leituras. Ele construiu uma narrativa tão volátil que em cada
leitor ela reage e se torna algo diferente. Para mim foi absolutamente
perturbador. Perturbador de um jeito bom e de um jeito ruim.
O livro conta apenas a história de um garoto que está
voltando para casa depois de ter sido mais uma vez expulso do colégio. É uma
viagem que dura um final de semana. E durante a jornada ele vai encontrando
pessoas, relembrando fatos e pensando sobre o seu lugar no mundo. Ainda preciso
ler, mas soou muito semelhante à estrutura de “Odisséia”, de Homero. A volta de
Ulisses para Ítaca depois da guerra de Tróia, enfrentando deuses, ciclopes e
sereias. Fez sentido pensar em Holden Caulfield como um herói trilhando uma
jornada, a jornada a que todo ser humano está fadado de alguma forma – talvez a
mais importante e mais perigosa: aquela que procura o sentido da vida adulta e
do viver em sociedade.
E embora Holden ridicularize a maioria das pessoas que
encontra, quando Salinger resolve nos abrir as frestas mais profundas e
dolorosas da alma do garoto, é impossível não se comover. É impossível não
entender exatamente quando ele diz que algo o deixou “deprimido pra burro” ou
“nunca me senti tão sozinho” ou “tive vontade morrer, no duro”. É engraçado,
mas o que ele arranca de nós é aquele tipo de sorriso de quem já esteve ali,
naquela situação. É brilhante, é genial, mas cima de tudo é simples e
verdadeiro. É uma vozinha perdida no centro de Nova York que irradiou, como em
um prisma, as vozes de várias gerações.
E é realmente difícil não entender porque é considerado um
dos livros mais influentes do século XX. Consegui ouvir, na narrativa de
Holden, a voz de vários outros personagens adolescentes que chegaram antes na
minha vida através da literatura.
Uma vez, Hemingway disse não haver nada, nem antes, nem
depois, de Huckleberry Finn. Não sei, mas hoje – ao calor da hora – me arrisco
a dizer que não há nada, em matéria de representar a voz de um jovem buscando
um lugar no mundo e um pouco de conforto e sentido na vida, do que “O apanhador
no campo de centeio”. Todos os outros que posteriormente se lançaram nessa
discussão parecem uma cópia não tão bem executada.
Estou com a sensação de não querer ler mais nada. É como se
eu tivesse realmente atravessado um limiar. Sei que vai passar, mas não deixa
de ser um sentimento muito poderoso provocado por um livro.
* Texto originalmente escrito em 06 de novembro de 2013,
logo após a leitura do livro. Por motivos que a própria razão desconhece ele
não foi postado antes – mentira, eu acreditava que o blog deveria corresponder
a minha cronologia de leitura, e todos os outros textos estão atrasados. A
publicação deste texto, porém, não é uma prova de que não acredito mais nisso,
apenas de estou imersa no caos e sucumbi ao desespero.
Nossa, esse foi no calo, hein, Maira? Eu li ano passado, achei belíssimo, cheio de simbologias bonitas, uma visão muito verdadeira da adolescência. =)
ResponderExcluirNossa esse livro é um dos meus favoritos da vida ! A escrita do Salinger é deliciosa, e o Holden por muito tempo foi meu modelo juvenil, sei lá porque mas, ele representava muita coisa que me identificava. Preciso reler, faz muito tempo que li, merece um retorno
ResponderExcluirbeijos !
Eita que a vontade de ler esse livro está pulando feito louca aqui, haha!
ResponderExcluirVou tentar adquirir alguma edição no sebo para, algum dia, ler :)
:*
Eu reli esse livro este ano e encontrei uma história completamente diferente daquela que eu havia lido uns 15 anos antes. Da primeira vez, tive uma decepção (em parte porque eu esperava outra coisa e em parte porque provavelmente eu era tão chata e adolescente quanto o próprio Holden); nessa minha releitura enxerguei o brilhantismo do livro. Foi ótimo ter dado uma segunda chance ao Salinger.
ResponderExcluirbjo